domingo, 7 de março de 2010

Sakura ~ Yume


De olhos bem abertos e atentos ela contava, quantas pétalas caiam sobre os seus cabelos, a moça alta, a pele branca como a neve e os cabelos loiros na altura da cintura, os lábios vermelho-claros machucados pelas mordidas que ela insistia em dar, com saudade da única pessoa que a mantinha em pé.
Era primavera, as cerejeiras floresciam e ela estava em um festival muito comum, adorava tudo aquilo e sempre que acontecia, corria até lá mesmo que sua amada não pudesse estar com ela. O quimono florido na cor preta de seda, o sorriso gentil enfeitava o rosto e pela maquiagem mal se dava para notar que ela era ocidental.
Ela se sentou ali, embaixo a uma das cerejeiras, as pessoas que passavam comparando a beleza dela com a das flores, a menina parecia tão feliz, estava ansiosa mas se preocupava com o humor da pessoa que iria ver, mal se percebia que suas mãos tremiam.
O vento soprou, levando os cabelos dela a face, as flores que caiam ao seu redor tornava tudo mais harmonioso, pegou uma das flores que caiu sobre seu cabelo e guardou no Obi do quimono. Ela olhou o relógio no centro da praça, marcava seis horas, tirou os chinelos de madeira e ajeitou os cabelos, estava atrasada, correu por entre as pessoas em direção a grande casa um tanto afastada do local, entre as arvores, onde se podia ter uma bela e tranqüila visão das cerejeiras tão perfeitas que se assemelhavam a aquela moça pálida.

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Assim que cheguei a casa, simplesmente me ajoelhei cuidadosamente diante a porta do local, abrindo-a com movimentos sutis, delicados, as mangas compridas do quimono cobrindo as mãos cujas unhas pretas me causavam uma estranha sensação de vazio, como se tudo em mim estivesse perdido. Ela estava ali sentada, perante a mesa, bebendo saquê com um quimono igualmente preto, era a roupa que se usava nessa época do ano, apesar de não ser do nosso feitio. Me levantei ainda com movimentos sutis e fiquei parada diante daquela imagem que me causava tantas lembranças. A arrogância dela havia sumido com o vento.
- Venha cá. – Chamou e fez um gesto com a mão direita enquanto a outra terminava de escrever até chegar no ponto final de uma frase e o meio sorriso estava nos lábios dela, gentil e sutilmente arrogante ou talvez malicioso, dependia muito do meu ponto de vista então tentei ser cautelosa.
Me aproximei da minha amada e fiquei de pé diante dela, como se estivéssemos mesmo na época dos samurais antigos, uma pequena brincadeira que me fez rir baixo.
- Sente-se. – Delicadeza era o essencial, ajoelhei ao seu lado, observando a folha de papel surrada e amassada na qual ela escrevia palavras vazias, sentimentos distantes, dor e angustia.
- Esta se comportando mesmo como uma gueixa... – Ela riu.
- Eu sei que gosta disso e bem nessa época isso é normal, gosto dessas comemorações. – Ela selou meus lábios.
- Igualmente... Você fica linda perto das cerejeiras. – Meu rosto se corou.
- Die... Não diga isso...
Aquele nome se perdeu no ar e agora a mão que eu levei ao rosto com cuidado, tentando ser o mais delicada possível, ela segurou com uma das mãos, aproximou-se de mim e minha respiração se perdeu, eu não me lembrava de como se respirava. E sempre foi assim, a cada vez que ela tomava meus lábios em um beijo.
- Ah sim, temos que conversar... Desculpe... Sabe esse fim de semana que íamos passar juntos... – Sorri, preparei o fim de semana a semana toda. – Não poderemos ficar juntos... Eu tenho muito trabalho, terei que ver algumas coisas...
- Ah... – Estranhamente, como me era de costume, ao invés de ficar chateada, eu sorri para ela, abertamente.
- Por quê sorri dessa maneira? Preparou esse fim de semana faz tempo e eu digo que não posso estar junto a você, você simplesmente sorri. Não entendo.
- Simples, entendo o seu trabalho... Sei que precisa disso e que precisa estar lá, então... Bem deixe para a próxima certo? Posso preparar outro fim de semana para nós dois. Não há problema. – Servi um pouco mais de saquê a ela.
- Você é tão boazinha Kaya...
Aquelas palavras... Ecoaram na minha cabeça... Ela sempre dizia isso, eu me sentia tão boba, mas adorava o som daquelas palavras... Ela estava ali comigo mais uma vez e meu olhar se perdeu no vazio, observando o rosto da pessoa que se tornou minha vida, a única pessoa que eu queria do meu lado.
- Kaya...? Amor...?
“Acordei”, derramando o saquê no meu quimono mas logo pegando um pano que tinha por perto e limpando aquele liquido da roupa, claro que ela me ajudou.
- O que houve,hn? Parecia estar olhando o vazio enquanto me olhava... Algum problema?
- Não, nenhum... Esta tudo, perfeitamente bem... – Ela deu um pequeno riso.
- Boba... Vem, vamos sair.
Ela se levantou e segurou minha mão, me puxando e o saquê novamente se derramou no chão, não importava, sua mão me segurava com força e correu para fora de casa, correu comigo até longe, onde o sol estava se pondo, um lugar perto daquelas arvores, onde não havia ninguém, não havia tristeza, o lugar perfeito.
- Falta pouco, amor! – Disse ela, me olhando, os cabelos descoloridos ao vento e cobrindo a face, passamos por várias árvores até que, entre várias cerejeiras estava um pequeno lago e uma pequena ponte, a água transparente coberta por pétalas cor de rosa, mal se podia ver a própria imagem refletida.
Ela se sentou e encostou-se na pequena grade da ponte, fazendo um gesto com as mãos para que eu fosse até ela, eu estava digerindo as palavras, o local... Tão parecido com aquele antigo onde costumavam estar sempre... Tão perto e tão longe... Caminhei até ela e sentei entre suas pernas, de costas para ela, encostando minha cabeça em seu peito como era de costume, não havia ninguém para nos incomodar, ninguém para estragar a imagem perfeita dos meus sonhos.
Ela beijou meu rosto e acariciou os meus cabelos, meus olhos se fecharam, o doce som da voz dela era musica para os meus ouvidos:
“ - Hn... E se um dia brigarmos, se acharmos que não vai mais dar certo ou quisermos dar um tempo, algo assim... Eu esperarei até que você faça dezoito anos e irei te buscar...
- Jura...?
- Juro...”
Foi a promessa que ela fez, e agora nós éramos mais velhas, tínhamos nossas responsabilidades mas ela mesmo assim cumpriu o que prometeu, quando eu completei dezoito anos ela me levou a um lugar distante com ela, longe dos olhos de todas as pessoas invejosas e agora estávamos no local onde meus sonhos estavam, na verdade, onde ela estivesse, meus sonhos estariam...
As mãos molhando-se por lágrimas que deixavam meus olhos, uma delas foi até o Obi, pegando a pequena flor que carregava desde a celebração, a menor tomou-a nas mãos e sorriu para mim, colocando a flor nos meus cabelos e selando meus lábios, eu não queria que aquilo nunca terminasse...
“- Promete que nunca vai me abandonar...?
- Prometo...
- Eu te amo...”
Murmurei, um sorriso se formou nos lábios dela e ela mordeu um dos piercings, olhando o pôr-do-sol entre as árvores.
- Kaya... feche os olhos... – Eu o fiz, ali não havia medo, não havia incerteza, ao lado dela eu sabia, não devia temer nada... – Ela beijou todo o meu rosto para beijar meus lábios, um beijo que me tirou o fôlego, como eu adorava o sabor daqueles lábios, eu ansiava em tê-los todos os segundos, todo o tempo. Ela distribuiu pequenos beijos pelo meu pescoço e me abraçou com mais força.
- Me diga uma coisa... Qual é o seu maior sonho...? – Murmurou.
- Ficar aqui com você... Para sempre, sem nada que nos impeça de ser feliz... Quero seu sorriso para sempre, quero seu coração, ouvir a sua respiração, quero você. – Ela sorriu - E qual é... O seu sonho, meu amor...?

...

Cuide bem dele, Die... Ele é meu tesouro para você... Ele sempre será seu, quando não tiver mais esperança, ele estará com você, quando estiver tudo acabado... Meus últimos pulsos serão pedidos desesperados por você... Quando você não tiver mais motivos... Saiba que... Você ainda me tem nas suas mãos e meu coração é o bem mais precioso que eu lhe entrego aqui.

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